Quanto vale o sofrimento de alguém?
Dia Internacional da Mulher
Nesse mês de maio, como no dia oito comemoramos o Dia Internacional da Mulher, achei pertinente apresentar um tema que envolve alguns tabus nos Tribunais de Justiça: A compensação por danos morais recebida por mulheres vítimas de violência doméstica.
Sobre a questão, o STJ decidiu, em sede do procedimento de recursos repetitivos (os quais têm força vinculante e apresentam um direcionamento para todos os juízes julgarem no mesmo sentido casos semelhantes) a possibilidade de fixação de indenização por danos morais no processo penal, apenas se houver pedido específico da acusação ou da parte ofendida.
Contudo, o que algumas vítimas de violência não sabem é que, em paralelo a ação penal ou mesmo não existindo a ação penal, essas podem mover uma ação civil para reparação dos danos materiais ou morais pela violência suportada. Obviamente, relacionado aos danos materiais, é fácil a constituição das provas e sua contabilização. O problema se dá quando falamos em danos morais. Como mensurar quanto vale o sofrimento de um indivíduo?
No Brasil, o STJ firmou a tese da mensuração ter como base a extensão do dano e a capacidade econômica do ofensor. Ainda, determina que o valor deve estar de acordo com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Ou seja, persisto na questão: como mensurar o sofrimento de um indivíduo? O que significa “extensão do dano”? O que está em conformidade com princípios da proporcionalidade e razoabilidade?
Diante disso, fiz uma pesquisa simples no banco de sentenças do Tribunal de Justiça de São Paulo, para entender em que circunstâncias e quais os valores das condenações por danos morais nos casos de violência doméstica. Importante ressaltar não se tratar de uma pesquisa científica. Escolhi, aleatoriamente, 10 processos cíveis, iniciados entre 2017 e 2022, os quais foram analisados até decisão de 2º grau de jurisdição.
Nessa pequena avaliação, coletei condenações em valores entre R$ 3.000,00 e R$ 35.000,00, conforme a tabela:
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Ficou evidente, ao analisar sentenças e acórdãos, que para a configuração e efetiva condenação do agressor em danos morais, devem ser muito bem constituídas provas das lesões físicas Ssuportadas pelas vítimas. Inclusive, no único processo com improcedência do pedido, a justificativa se deu pelas testemunhas não terem presenciado as agressões. Outro dado constatado foi o fato de apenas um dos processos fundamentar o valor da condenação na capacidade econômica do agressor.
Esse caso resultou na condenação de R$ 3.000,00. Um julgamento à revelia (ou seja, a parte não se defendeu no processo) que “supõe” a capacidade econômica do réu; afinal, a parte não se apresentou na ação. Ainda, na aferição do grau de culpa, o juízo diz levar em consideração que “as desavenças eram relacionadas aos cuidados com os filhos, feitas com exageros recíprocos, sendo destacado, pela testemunha, sobre as agressões físicas, que réu estaria alcoolizado ou embriagado, provavelmente, sem o correto discernimento para evitar o excesso no emprego da força física” (ABSURDO!).
Outra decisão que chamou a atenção foi a condenação no valor de R$ 30.000,00. No caso, o agressor, desobedecendo medida protetiva, ateou fogo no corpo da vítima, deixando-a com queimaduras de 3º grau e sem o movimento das pernas. Na decisão o juízo aponta que no processo penal, a títulos de danos morais, o réu já tinha sido condenado a R$ 5.000,00 e, tendo em vista a extensão do dano, era justo à autora buscar indenização maior na esfera cível. Completa a decisão fundamentando que uma condenação de R$ 30.000,00, acrescido ao valor da esfera penal, estava dentro do proporcional e razoável para o caso. Proporcional e razoável para alguém que perdeu a capacidade de andar?!
O aspecto mais doloroso dessas condenações é que, após a sentença, a vítima ainda tem de passar pela fase de cumprimento e, somente ao final dessa etapa e, somente se encontrar bens do agressor, a vítima verá concretizado o valor monetário determinado em juízo. Ou seja, permitem usar, aqui, um clichê: a Justiça ainda está longe de fazer justiça às causas de danos morais. Compete a nós, advogados; promotores e defensores públicos lutar por decisões mais justas e efetivas nesses e em muitos outros casos.
2 respostas para “Quanto vale o sofrimento de alguém?”
Parabéns pela reflexão Dra.
Milena. Realmente temos
Muito a melhorar como Seres humanos…Dr. GilbertoDevemos lutar sempre, pois em muitos casos a justiça é falha.
Esse valor que é calculado como danos , na maioria das vezes fica muito a quem da realidade, ou seja do mal que o agressor fez a vítima.
Vamos lutar para que realmente seja digno a indenização pelos danos causados.
Vamos a luta, advogados, promotores, Juízes , desembargadores, etc…
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